Rede de Bibliotecas Escolares do Estado de Goiás

Este projeto se insere no âmbito de duas áreas do conhecimento: Educação e Biblioteconomia. Um dos campos de estudo mais proeminentes em nossa área é o do letramento informacional (information literacy), que diz respeito a como os estudantes buscam, acessam e usam informação nos mais diversificados contextos (CAMPELLO, 2009; GASQUE, 2010).

Países avançados na educação tem se preocupado desde a década de 50 em formar cidadãos letrados no uso da informação desde a educação básica (FIALHO, 2009). No âmbito da escola, estudos no mundo inteiro sugerem que a biblioteca da escola exerce um papel fundamental nesse processo, principalmente através do ensino das habilidades de pesquisa e do incentivo ao hábito de leitura. Precisamos, portanto, de bibliotecas escolares com boa infra-estrutura e profissionais qualificados atuando nas mesmas. Países como Estados Unidos, Austrália, Reino Unido e Portugal têm desenvolvido importantes trabalhos nesse sentido, ao demonstrarem a relação profícua entre o processo de ensino/aprendizagem e as bibliotecas escolares através da atuação colaborativa entre professores e bibliotecários. Tais estudos demonstram também que o conhecimento gerado pelos programas de letramento informacional nas escolas ajuda os estudantes no aprendizado ao longo da vida (lifelong learning) em diversas questões ligadas ao universo profissional, sexualidade e escolha de estilos de vida.

No estado de Goiás, a situação é precária e urgente, pois temos salas de leitura funcionando em espaços inadequados, sem profissionais qualificados e recursos materiais, muitas vezes depósitos de livros sujos e mofados debaixo de escadas, conforme demonstra o estudo de Silveira (2010); um dos poucos a fazer um levantamento mais detalhado do assunto. Não há o cargo do profissional bacharel em Biblioteconomia nas bibliotecas das escolas estaduais e normalmente aloca-se para lá profissionais com todo tipo de problema de adaptação em outros ambientes da escola. O estudo de Silveira (2010) aponta que o primeiro programa para bibliotecas escolares estaduais foi criado em 2001, denominado Programa de Bibliotecas das Escolas Estaduais (PBEE). O mesmo visava atender aos estudantes do 5º ao 8º ano do ensino fundamental, ensino médio e às próprias necessidades de atualização dos professores.

Ainda conforme apontado por Silveira (2010), o acervo foi formado por livros de literatura e livros informativos de Língua Portuguesa, Matemática, Língua Estrangeira: Inglês e Espanhol, Sociologia, Filosofia, Geografia, História, Ciências, Artes e Educação Física. O autor prossegue em seu delineamento histórico, verificando que, em 2009, foram criadas ações voltadas para a capacitação de professores dinamizadores de biblioteca, que deveriam ser professores leitores, responsáveis por metodologias e ambientes propícios ao desenvolvimento do hábito de leitura nas bibliotecas/escolas.

Como se pode perceber, nenhum desses programas contava com a presença de bibliotecários para administrarem as bibliotecas e os acervos. No caso do PBEE, alguns bibliotecários ministraram treinamento para os dinamizadores de bibliotecas e forneceram instruções voltadas à organização do acervo. Esses programas passam, atualmente, por "descontinuidades". Entre uma gestão pública e outra, o que se observa é o descaso em relação a esse tipo de ação política. Entretanto, estudos como o de Silveira (2010) podem ser considerados como ponto de partida para uma nova reflexão sobre a situação das bibliotecas nas escolas estaduais.

No dia 18 de novembro de 2009 foi realizada a primeira audiência pública sobre biblioteca escolar do Estado de Goiás, com representantes da Federação Brasileira de Associações de Bibliotecários do Estado de Goiás; do Ministério Público do Estado de Goiás; da Secretaria de Estado da Educação de Goiás; do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial; do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial; do Serviço Social da Indústria; do Sindicato das Escolas Particulares do Estado de Goiás; do Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino no Estado de Goiás e da Universidade Federal de Goiás. Nessa audiência foi discutida a importância da biblioteca escolar como instrumento de ensino-aprendizagem na formação de estudantes da rede pública e privada. Foi uma audiência bastante produtiva, na qual as autoridades que ganharam vozes reconheceram a importância desse espaço no cotidiano da escola.

No ano de 2010, dois eventos importantes ocorreram no que diz respeito à biblioteca escolar no Brasil: a sanção da Lei Federal 12.244 referente à universalização das bibliotecas escolares, que obriga todas as escolas da rede pública e privada do país a contarem com bibliotecas com infra-estrutura mínima e profissional bibliotecário formado em curso superior e a publicação dos Padrões para Criação e Avaliação de Bibliotecas Escolares pelo Grupo de Estudos em Biblioteca Escolar (GEBE) da Universidade Federal de Minas Gerais.

O mais recente texto da Resolução do Conselho Estadual de Educação de Goiás CEE/CP nº. 5,  de 10 de junho de 2011, prevê que uma escola só pode pedir licença para funcionamento se contar com biblioteca e bibliotecário formado, bem como padrões mínimos para o funcionamento da mesma, assim como o desenvolvimento de programas de letramento informacional. Foram acrescentados ao texto da Resolução os seguintes parágrafos:

 

Art. 119. A Biblioteca escolar é um componente essencial, situado no espaço físico da escola, que objetiva reunir, tratar e disponibilizar informações a professores, estudantes, funcionários e à comunidade escolar, auxiliando no processo de ensino-aprendizagem; suas funções educativa, recreativa, cultural e social tornam - se indispensáveis para o desenvolvimento da competência informacional de seus usuários.

§ 1º Toda escola deve obrigatoriamente implantar e implementar sua biblioteca, atualizando constantemente o acervo, dando preferência às demandas oriundas dos conteúdos curriculares de suas respectivas séries, módulos, ciclos e etapas.

§ 2º A biblioteca deve ser preferencialmente informatizada, com acesso a internet e seção de empréstimo.

§ 3º Os funcionários já lotados na biblioteca deverão ser capacitados, coordenados e supervisionados pelo bibliotecário responsável.

Art. 120. O responsável por gerenciar, organizar, desenvolver serviços e produtos de informação e realizar atividades pedagógicas e culturais em conjunto com os professores e estudantes em uma biblioteca escolar deve ser um bibliotecário, com formação superior em Biblioteconomia.

§ 1º A instituição de ensino que tiver mais de 500 (quinhentos) educandos deverá ter um bibliotecário devidamente registrado no Conselho Regional de Biblioteconomia em seu quadro funcional.

§ 2º A instituição de ensino que tiver menos de 500 (quinhentos) educandos deverá recorrer à orientação e supervisão de um bibliotecário, devidamente registrado no Conselho Regional de Biblioteconomia, para capacitar, supervisionar, orientar e avaliar os funcionários da biblioteca.

Art. 121. O Sistema Educativo de Goiás, compreendido pelo sistema público e privado, deverá investir na contratação de bibliotecários para todas as bibliotecas escolares, existentes e para as que forem criadas, como no mobiliário e na ampliação e atualização do acervo bibliográfico e multimeios, nos termos da legislação em vigor.

 

A inclusão do texto na resolução constituiu uma grande conquista da comunidade, ao esclarecer o papel da biblioteca e do bibliotecário no contexto educacional, enfatizando a competência informacional. O referido texto destaca o bibliotecário como figura fundamental no projeto pedagógico da escola, conforme se pode observar no parágrafo do Art. 99:

 

Parágrafo único. O Conselho de Classe é constituído pelo diretor, pela coordenação pedagógica, pelo bibliotecário, por todos os professores que atuam naquela classe, pela representação legal dos alunos e dos pais e demais componentes, previsto no projeto político pedagógico da unidade e no regimento escolar.

 

Todas essas ações foram possíveis a partir de uma articulação política entre o curso de Biblioteconomia da UFG, profissionais bibliotecários e representantes do Conselho Estadual de Educação. Apesar desse reconhecimento na legislação, as escolas estaduais atualmente ainda não contam com bibliotecários atuando em suas funções, mas ocorreram cogitações para a realização de concurso público para bibliotecários em 2010. Atualmente, não há informações claras sobre esse possível concurso. Todos esses documentos se encontram disponíveis integralmente na Internet[1]. Portanto, não é qualquer espaço da escola que pode ser chamado de biblioteca e há uma necessidade urgente que desenvolvamos um plano para a construção da rede estadual de bibliotecas escolares.

Diante desse cenário, fazemos a reflexão: como propiciar a inserção de nossas crianças e jovens na sociedade da informação? Como ensiná-las sobre o uso ético da informação e que pesquisar não é um ato de "copiar" e "colar" informação da Internet? Os estudos mostram que o professor, juntamente com o bibliotecário, são os profissionais responsáveis por ajudar a desenvolver as competências de busca e uso da informação com os estudantes e que as mesmas dizem respeito a: reconhecimento da necessidade de informação, formulação de questões, localização de informações, uso das fontes de informação, solução de problemas, pensamento crítico, comunicação de ideias, respeito à propriedade intelectual, capacidade de inovação e estímulo à leitura (AACRL, 1998).



[1] Lei 12.244, de 24/05/2010. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Lei/L12244.htm>. Resolução do Conselho Estadual de Educação de Goiás. Disponível em: < http://www.cee.go.gov.br/wp-content/uploads/Resolu%C3%A7%C3%A3o-CEE-CP-N.-5-de-10-de-junho-de-2011-rev-13-07.pdf>. Acesso em: 10 Jan. 2013.